Thursday, 2 November 2006



O ESPAÇO DA PINTURA

O espaço da pintura é um universo de acontecimentos de significação, onde o artista elabora seus conteúdos num embate permanente com os elementos físicos dos quais é composta a pintura: tela, tintas, pincéis, e toda a espécie de material usado por ele. Fazer arte é antes de mais nada formar uma matéria, configurar uma gama de possibilidades latentes.É explorar o desconhecido numa aventura insólita e concreta.Para que isto aconteça, no entanto, o artista decide por escolhas a todo o momento, escolhas que no instante em que são feitas, excluem outras tantas possibilidades e caminhos.Através destas escolhas ele se coloca e se imprime na obra.Desta forma, vai demarcando aspectos do seu ser. Artista e obra são neste momento um só fluxo, ininterrupto de energia e criação. Quando o artista cria ele está diante de um intrincado jogo de relações que através de suas escolhas vão tomando corpo e fazendo surgir e sugerir uma rede de significações, e vai nascendo então o corpo poético do trabalho em si.Ele fala através de metáforas.
Porém, depois de “pronto” o trabalho, este é muito mais do que a soma de todas as etapas que o compõe, ou seja, a partir do momento em que a obra sai para o mundo, ela passa a ser um espaço muito mais amplo do que antes, pois agora ela é também a soma de todos os olhares que pousarem sobre ela, expandindo-se constantemente, e provocando sucessivos ressignificados.Exigem agora não apenas um olhar contemplativo,mas um olhar que pensa.Artista, obra e espectador são aspectos diferentes de uma mesma questão. No exato momento em que se encontram, aí nasce uma nova maneira de ser, sentir e ver a vida, cria-se uma expansão do pensamento que conduz a outras formas de ver e perceber as coisas.

http://www.artewebbrasil.com.br/espaco/artigos_arteweb.htm

Tuesday, 18 July 2006

 
Sobre arte, gravura e o fazer do artista

A arte para mim é, sobretudo um modo muito particular de ver e perceber o mundo, dentro de mim e a minha volta. Posso não pintar ou desenhar todos os dias, mas 'penso' em arte boa parte do meu tempo. Isso significa que meu olhar se constitui como um prisma, onde a luz passa através e se converte em todas as cores. No caso, a arte estaria para luz assim como as cores estariam para as minhas experiências no mundo. 
Através da arte aprendi a entrar em contato com a parte mais sutil de todas as coisas. Como um canal que me conecta a um mundo não imediatamente visível. As obras são coisas concretas, constituem-se de matéria: papéis, tintas, o algodão da tela, o cimento, ferro, o barro, o mármore, o vídeo, etc. Porém através das mãos do artista se transformam em algo além da matéria inicial da qual sao feitas. O artista acrescenta a sua obra toda a sua vivencia e a obra fica impregnada de suas relacoes com o mundo. Uma espécie de energia que ele extrai da matéria sutil do qual e feita a vida. Um mundo poético, onírico e pleno de possibilidades. O espectador diante da obra se liga a este mundo, é transportado até ele pela via do artista. Tem, porém um papel ativo neste processo, pois estando ali com tudo aquilo que lhe pertence, que é parte de seu próprio ser e de seu próprio mundo, torna-se também um participante ativo no processo de significação da obra. E é justamente aí que reside a grande beleza da arte, nesta teia de ressignificações possíveis contidas em todas as obras de arte.  Artista e espectador se encontram, se fundem neste momento. 
Criar para mim significa dispor e usar de múltiplos meios a minha volta, usando a pesquisa como ferramenta de descoberta de infinitas possibilidades, técnicas e poéticas. Pintura, escultura, desenho, fotografia, gravura, etc. Cada técnica revela-se em sua natureza de modo muito particular e característico. Oferecendo às mãos e a imaginação do artista, o que cada uma pode dar, à sua maneira própria. Venho trabalhando com arte desde há muito tempo, e cada vez mais o campo se expande e meus conhecimentos tornam-se pequenos diante de tanto a saber e a conhecer. 
O contato com a gravura aconteceu durante esta jornada de pesquisas e descobertas, na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, e na Oficina de gravura, ambos ministrados pela professora e artista plástica Juliane Fuganti. Significou para mim a abertura de um outro universo de possibilidades e afetividades. Permite a execução de trabalhos, que outras técnicas, até então, não haviam revelado. Cortar, perfurar, sulcar, pressionar, corroer, gastar, imprimir, gravar...toques firmes ou sutis. É a natureza do material que se confronta com as mãos do artista na tentativa de revelar toda a potência contida na matéria trabalhada.

Sunday, 2 July 2006

Qual o valor intrínseco de uma obra?O que é uma obra de arte?

                                                 S/ titulo/ monica cella/2003/a/s/t


Qual o valor intrínseco de uma obra?O que é uma obra de arte?
Há algum tempo atrás responder a essas questões seria talvez bastante provável e possível. Hoje ao invés de responder, nos colocamos mais e mais questões e perguntas a esse respeito. Mudaram os paradigmas que nos norteavam que nos guiavam e possibilitavam "algum acerto" acerca do que seria ou não arte. Não temos mais sólidas referências como no passado, ao contrário nos movemos em terreno movediço, nossos parâmetros não existem mais. Mudaram os códigos de leitura das obras, e hoje temos diferentes códigos para diferentes artistas. Isso nos leva perigosamente a um pensamento simplista: em arte atualmente vale tudo, daí a dificuldade de leitura, pois existem tantos códigos quantos artistas e proposições. Mas, eu proporia a seguinte questão: onde vale tudo, nada vale. Ou seja, nada tem valor. E esta é uma questão importante quando nos fazemos perguntas a respeito de obras de arte. Então eu traria a seguinte proposta: o valor de uma obra estaria ligado ao seu corpo poético, o equivalente ao corpo espiritual. Teríamos o corpo físico da obra, seu aspecto concreto, a matéria da qual é formada e sua configuração e dinâmica no espaço. E teríamos o corpo poético da obra, qual um sopro de vida, seu fluxo e refluxo, sua vibração no mundo, sua potência. Muitas obras nos fazem a proposta de existirem efemeramente, mas seu corpo poético permanece vibrando mesmo após desaparecerem fisicamente. Lembro de Hélio Oiticica e de seus parangolés, suas performances. Ligia Clark e seus objetos sensoriais, suas manipulações in loco no próprio “espectador” de sua obra.
Talvez a muitas obras falte esse corpo poético que dá substância e essência a elas e resta tão somente a inexpressiva máscara da aparência. Talvez...
Atualmente é difícil -- mesmo para um crítico ou curador -- posicionar-se efetivamente a respeito de muitas obras, pois como foi mencionado, nossos conceitos são frágeis e efêmeros, assim como nosso estar no mundo.
Talvez com o passar do tempo é que poderemos ver o que restou desse período, não só fisicamente no sentido das obras que permanecerem, mas até mesmo em termos de conceitos, propostas e do valor qualitativo das mesmas.

Sunday, 25 June 2006

Alma de artista

Monica Cella A alma do artista é povoada de imagens, seres de poesia que vivem à espreita de uma oportunidade para fazerem-se concretos, visíveis aos olhos.O artista é alguém que vive imerso no mundo das coisas e dos outros seres, mergulhado no mundo, sempre enxergando e buscando o invisível por trás de tudo o que existe.Olha e vê o mundo à sua volta com os olhos cheios de indagações, surpresas e poesia.Nas coisas mais simples e cotidianas, ele enxerga um universo completo, novo e diferente.Sempre um novo pretexto para inventar, criar e recriar o mundo (o mundo de dentro e o de fora).A fantasia, o sonho, o pensamento criativo se alastram e expandem a consciência humana. Ele bebe de diversas fontes, nutre seu trabalho buscando subsídios em tudo aquilo que vive.Toda gama de vivências sejam elas visuais, sonoras, táteis, emocionais, afetivas, oníricas, etc, passam pela alma do artista e fazem daí sua morada, enriquecendo e nutrindo seu caldeirão de saberes e conhecimentos com o propósito de elaborá-los e transformá-los de maneira alquímica em obras, imagens de sua criação. O olhar do artista que transforma tudo o que vê e o que toca, necessita de diferentes meios para elaborar suas imagens poéticas e transformá-las em seres com vida, que respiram. A pintura, a gravura, o desenho, o vídeo, a fotografia, o mármore, a areia, a terra, o lixo, a madeira, o ferro, a água, a cera, a parede, o sal, o metal, as pessoas, os pêlos, as peles, o carvão e a poeira...O suor e a saliva. Toda sorte de matéria e de materiais tornam-se experimentações em suas mãos e em sua imaginação, num fluxo continuo de idéias, invenções, possibilidades e ações.

A mais valia estetica da arte




A relação entre arte e capitalismo existe desde a muito tempo.
Na idade media, eram os detentores do poder economico, baroes e senhores feudais, quem contratavam os servicos dos artistas, atraves da encomenda de obras para seus castelos, estabelecendo-se desde entao uma relacao mercantil entre artista-obra-comprador.E asim prosseguiu, mais tarde no seculo XIII, com a igreja fazendo o papel de mecenas e encomendas aos artistas que por sua vez podiam viver de seu proprio trabalho.
O que acontece hoje é quase uma deturpação desta relação. Fica bastante claro quando nos propomos a fazer uma investigação nos diversos mecanismos que formam a dinâmica do circuito e do mercado de artes.
De um lado, os artistas, que produzem suas obras. A fim de mandá-las para o mundo, procuram a sua colocação nos devidos canais de circulação. De outro lado, os marchands, os leiloeiros,os críticos, os curadores, que no desempenho de suas funções, transitam entre dois mundos: o mundo poético dos artistas e o mundo real dos investimentos econômicos. Estabelecer uma relação entre o que é produzido e o momento em que vira mercadoria é somente uma questão de raciocínio lógico.Os mecanismos geradores da mais valia nas artes, principalmente nas artes plásticas, acontecem em razão direta da interferência do mercado capitalista sobre as obras.
A agregacao de valor a uma obra de arte acontece na medida em que a carreira do artista se desenvolve gradualmente e seus trabalhos vao adquirindo reconhecimento no circuito de artes atraves de varios fatores, tais como: premios obtidos, participacoes em eventos de artes de importância nacional e internacional, exposicoes individuais, etc.Enfim, uma trajetória sólida percorrida, e toda sorte de ocorrências que agreguem valor subjetivo e consequentemente econômico ao trabalho realizado pelo artista. Até aqui, todo este processo é bastante natural, e mesmo esperado das obras artísticas. A partir de um certo momento, em que o artista e o seu trabalho estão bem colocados no circuito de artes, começa também um processo de apropriação por parte do sistema capitalista da mais valia estetica que transforma a obra em fetiche, afim de explorá-la com intenção de ganhos econômicos.O que ocorre é uma super valorização do objeto de arte, que a partir de então é visto muito mais como uma mercadoria envolvida pelos processos do mercado e estrategias de marketing do que pelo seu valor estetico intrinseco.
Quanto mais elaborados os procedimentos fetichizantes agregados a obra, mais economicamente tem seu valor em alta no mercado, atingindo cifras astronômicas, supervalorizadas. O que acontece é que neste processo, muito do que é produzido hoje, é propositalmente direcionado a obter forçosamente esta valorização, esta aura artistica manipulada em ateliers-laboratorios sem muitas vezes ter um correspondente valor intrínseco na obra. O trabalho de um artista muitas vezes nem adquiriu o tempo necessario para seu amadurecimento.
Muitos personagens que compõe o circuito da arte, inclusive artistas, preocupam-se em construir seu nome, mais que sua obra a fim de obterem esta aura de supervalorização em seu trabalho.Os “mercadores” da arte por sua vez, vislumbram grandes possibilidades de ganhos em torno dos objetos artísticos, passam então a operar dentro da lógica capitalista, produzindo cada vez mais a mais valia-estetica da obra de arte. Estabelece-se assim um círculo vicioso difícil de se romper, onde cada um dos participantes tem seus interesses e benefícios garantidos.
Resta-nos, tão somente, levantar as questões pertinentes a ordem estabelecida, discutir-mos até onde pode ir toda esta engrenagem que embora valorize as obras economicamente, funciona mais como estímulo à produção de precários trabalhos que chamam de arte.




monica cella